Thabata Martin é jornalista que escreve sobre arquitetura e gastronomia.  Mulher que senta no balcão, sorri com um drink de personalidade forte e doçura sutil e ouve Sade como quem vive um momento único.

Reserva pra uma pessoa. Sexta-feira, 25 de julho, 19h. Cheguei no Motel, casa nova e concorrida da Chef Renata Vanzetto, em São Paulo, às 19h10, esbaforida e contrastante, com uma mala amarela a tiracolo. Sem pausa. Fui direto ao ponto. Uma semana antes, a hostess havia perguntado, pelo WhatsApp: “Tudo bem pra você ficar no balcão?” Respondi: Tudo! Claro. O balcão é, de longe, o melhor lugar num restaurante com vibe de balada soft.

A escada vermelha, estreita, lotada, me levou até o destino no mezanino. Neon e trilha sonora disco. Minha passagem pelo Motel começou ao som de Bee Gees, Night Fiver – mesma música que escolhi para coreografar em um aniversário de trinta e poucos anos. 

Já acomodada, cardápio com capa vermelha, cisnes por todos os lados e purê escorrendo sobre a batata. Tudo era sensual. Estava feliz pela comemoração dos meus 45 anos em um lugar com nome atraente. Minha idade nova também coincide com a nova fase da chef global, que substituiu o EMA, seu famoso restaurante – que apostava no menu degustação – por uma experiência gastronômica mais flexível.

Fui só. Mas não estive sozinha. Na cozinha aberta, na troca com os chefs, na conversa com a publicitária Isabel, outra sincronicidade. Minha companheira de balcão também fazia aniversário. Ela trabalhou anos na Casa Vogue e hoje faz parte do time da grife Hermès. Nos reconhecemos também pela área de atuação. Dividimos os pratos e brindamos nossas escolhas. 

A comida foi um prazer à parte. Comecei pelo Tuna Tuna (R$ 56): cubos de atum marinados no azeite vermelho, alho frito, pimenta e gema caipira para comer com crocantes. Pedi um extra de Pão na Brasa (R$ 14) — precisava “chuchar” aquela gema.

O chef Lucas, que me recebeu com simpatia, sugeriu o Caju Amigo (R$ 68), com peixe cru, salsa picante e limãozenta de caju. O “pratão” da noite foi o Arroz Safado (R$ 84), cremoso e escuro como a brasa, com tinta, vinagrete, aioli e shissô. Tudo no meu cardápio vibrava gosto de mar. Canceriana assumida.

Na taça, comecei pelo Shissôw (R$ 43), gin com framboesa, ameixa e shissô. Doce. Bonito. Mas me encontrei mesmo no apaixonante Long Beach (R$ 39), vodka infusionada, rapadura, folha de limão e borda cítrica. Influência de “Paradise” – canção de Sade que remete a um paraíso íntimo e pessoal? Talvez.

Minha sobremesa, puro charme: Cigarette pour la fin (R$ 30), biscoito crocante em forma de cigarro, servido num cinzeiro vintage estampado com um cupido.

A estética do prazer

Sentar no balcão é sexy. A cozinha está diante dos olhos, praticamente sem barreiras. Vejo o fogo, sinto a movimentação no calor. A equipe interage. Diego Oliveira, cozinheiro, me contou sobre a curtição de trabalhar ali. “Os clientes gostam de tirar foto, filmar. Eu curto conversar com o pessoal. O formato cobra mais atenção com a organização dos processos, mas a proposta acrescenta para os dois lados”.

Mais que um restaurante, o Motel chama atenção pela cenografia. Assunto que me desperta total atenção. Conhecer o chef consultor Guto Cavanha foi um presente. Às vésperas de abrir um novo projeto com sua esposa, a influencer Julia Faria, ele vive um hiato para se reencontrar. “Queria me ver como eu era quando comecei. Me encontrar de novo. A resposta sempre está dentro.” Segundo Cavanha, o ambiente precisa conversar com o prato, mas o prazer tem que vir da comida boa. Do estar ali, inteiro. E a proposta é realmente ser imersivo – 360º.

Concluo que Motel reafirma o que alguns endereços de São Paulo fazem com maestria. A gastronomia do desejo não se limita ao prato. Envolve endereços que não são visitados apenas para comer. Tem a ver com imagem. A provocação é sobre a interação com o público. É sobre pessoas. E isso me atrai.

Artigos relacionados